Submissão X Conveniência: uma perigosa rivalidade

28/02/2012 15:48

 

No cristianismo algumas coisas são de importância fundamental, podendo ser chamadas de condição sine qua non (sem a qual não é possível). É o caso da submissão. É possível nos declararmos cristãos sem ser submissos, mas não é possível ser cristão sem que tenhamos submissão plena a Deus. Veja a distância entre uma declaração e o verdadeiro “ser” cristão. Quase todos que conhecemos, inclusive muitos dos que congregam em nossas igrejas, se denominam cristãos, mas no sentido pobre da palavra. Verdadeiros cristãos são seguidores de Cristo e de seu Evangelho (aquele evangelho que ele pregou e viveu). Para estes a submissão a Deus é um jeito de viver. Um prazer diário. É o ar que o cristão respira.

Submissão é acatamento, subordinação. É espontânea aceitação de uma autoridade, ordem ou situação. É o ato pelo qual se admite uma jurisdição, poder ou pessoa que, de acordo com o direito, exerça o poder. É a disposição para aceitar um estado de dependência. É um estado de rebaixamento servil, subserviência. Uma submissão genuína é constituída de uma disposição de coração em se deixar sob a autoridade de outro.

Na história da humanidade o fracasso foi marcado exatamente pela falta da submissão. Diante das ricas e que deveriam ser inquestionáveis orientações de Deus, nossos primeiros pais resolveram dar ouvidos à dúvida, levantada pela serpente no Éden, sobre as pseudo razões que levaram Deus a ordenar que não fosse comida da fruta da árvore que estava no meio do jardim. E...  Você sabe: desde então não paramos de questionar a Deus e dar ouvidos à serpente. Na verdade deveríamos sempre fazer o contrário: seja a Palavra de Deus sempre verdadeira, e se alguém deve ser questionada é a serpente e sua lógica.

Sábios aqueles que estão lutando para fazer o caminho inverso ao de Adão e Eva. Que retornam o controle de suas vidas para Deus, admitindo que, desde que a orientação proceda dele, não há o que racionalizar. E que os questionamentos são merecidos sim, mas para a serpente, sobre por que ela e todas as suas inquietações também não se submetem a Deus. Mas nossa prática mostra que poucos têm sido sábios. Com certeza por isto nos clama alto a sabedoria através do livro de Provérbios.

E esta é a questão que ofereço a discussão neste texto: a necessidade de sermos submissos e não meramente convenientes. Quando elegemos nossa conveniência em atender este ou aquele preceito, fazer isto ou aquilo, o que vai estar imperando não é a submissão, mas nossa conveniência. Se a razão para fazermos algo ou deixarmos de fazer passa pela análise do quanto esta ou aquela prática atende ou não a nosso interesse ou a nossa forma de pensar, então a razão de nosso posicionamento é a conveniência. E nossa conveniência, mesmo que sacramentalizada, não atende a Deus.

O que atende a Deus é nossa submissão a sua vontade. O exercício de nossa capacidade de elaborar racionalizações deveria encontrar objetivo e limite no discernimento da vontade de Deus. Neste exercício do poder da razão devemos estar compromissados de verdade com a vontade de Deus, mesmo que fira nossa vontade ou nossos interesses. É como se um cozinheiro fosse a sua cozinha preparar uma saborosa refeição. O resultado pode ser o mesmo: um manjar único. Mas importa saber se a motivação maior do cozinheiro foi satisfazer a seus anseios pessoais por uma majestosa superação de suas habilidades culinárias ou se foi satisfazer aquele que iria tomar a refeição que fora preparada.

Do mesmo modo podemos ser profissionais exemplares, pregar belas mensagens, edificar belos templos ou ajuntar muitas pessoas. Podemos plantar muitas igrejas ou ainda praticar muitos atos misericordiosos. Mas precisamos ter bem definido em nosso coração a motivação com que isto venha a acontecer. Se a razão passa pela nossa satisfação pessoal ou de outrem, isto é mera conveniência. Se nossos resultados visam primeiro atender a metas organizacionais então a motivação principal não foi nossa submissão a Deus. Assim não foram feitos para Deus. E não nos acrescentará nada espiritualmente. Antes nos será danoso, como obra de iniquidade. Somente será proveitoso se cada uma destas coisas for realizada sob o genuíno zelo de nossa submissão à vontade de Deus.

Por mais que alguém queira associar sua conveniência pessoal à vontade de Deus tal é impossível. Ou agrado a Deus ou ao meu ego. A salvo se minha vontade for fazer a vontade do Pai, como no convite do salmista: “agrada-te do Senhor” (Sl 37.4). A Bíblia não admite que possamos ter pensamentos como os do Senhor Deus. Isaías registra: “Porque, assim como o céu é mais alto do que a terra, assim são os meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os meus pensamentos mais altos do que os vossos pensamentos” (Is 55.9), e Paulo declara: “Ó profundidade das riquezas, tanto da sabedoria, como da ciência de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis os seus caminhos” (Rm 11.33). 

Se somos bons, como resultado de nosso interesse em ser assim reconhecidos, então não fazemos para Deus. Fazemos por conveniência, já sendo galardoados pelos reconhecimentos recebidos. Mas se somos bons em submissão a vontade de Deus, o resultado temporal será o mesmo, uma pessoa boa, mas Deus terá sido honrado com nossa submissão a sua vontade. Teremos feito de fato para agradar a ele. E se houve alguma conveniência, foi a conveniência da submissão verdadeira a Deus.

Como ajudar as pessoas a atender a vontade de Deus, se nos é difícil sair das amarras da conveniência? Como fazer quando nossos corações são dirigidos primeiro pela racionalização, ou seja, pela avaliação da conveniência. Quando a razão nos orienta por tantos outros caminhos, desde que não prevaleça a pergunta: qual é a verdadeira vontade de Deus, considerando sua verdade revelada na sua Palavra? O que fazer?

Alguém disse que se o que sabemos da Palavra de Deus não fizer uma ponte para o nosso viver cotidiano, seremos simplesmente réus do inferno. E esta ponte é o quebrantamento. Um quebrantamento que nos leve humildemente a nos submeter a Deus. Um quebrantamento que nos leve a confiar em Deus, derribando raciocínios e todo baluarte que se ergue contra o conhecimento de Deus, e levando cativo todo pensamento à obediência a Cristo (2 Co 10.5). Um quebrantamento que nos ajudará a eleger a submissão a Deus como único jeito de ser e não nos deixará sucumbir na incorreta escolha de atender ao que nos convém.

 

Por Samuel Alves